metropoles -02/10/2023 09:30
Diferentemente do discurso de união entre os Poderes adotado
pelos presidentes da Câmara e do Senado no início desta legislatura, o
Congresso Nacional tem enfrentado, nas últimas semanas, uma série de embates
com o Supremo Tribunal Federal (STF) sobre
discussões de determinados temas
Três assuntos considerados polêmicos, especialmente entre os
partidos mais conservadores, são alvo de julgamentos na Suprema Corte: o marco
temporal das terras indígenas; a legalização do aborto até 12 semanas de
gestação; e a descriminalização do porte e da posse de drogas.
Alguns parlamentares caracterizam as ações do STF como
“invasão de Poderes”, e os
embates têm gerado crises e boicotes em votações da Câmara dos Deputados e
do Senado Federal.
O ápice da tensão ocorreu na semana passada, quando deputados e senadores de 22
frentes parlamentares e dois partidos (PL e Novo) anunciaram que vão obstruir
votações nas Casas. Entre terça e quinta-feira, sessões foram canceladas e
votações em colegiados acabaram adiadas.
O
novo presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, negou atritos entre os
Poderes em coletiva na sexta-feira (29/9). “Não vejo crise entre Congresso
e STF. O que existe é a necessidade de relações institucionais pautadas no
diálogo e na boa-fé. Não tenho nenhuma dúvida de que isso ocorrerá”, afirmou.
Já o líder do PL na Câmara, Altineu Côrtes (PL-RJ),
criticou, na última quarta (27/9), o fato de o STF iniciar julgamentos sobre
assuntos que, em sua visão, são de competência do Congresso.
“Não é um movimento de direita ou de esquerda, é um
movimento do Parlamento. Não podemos aceitar que tenham acontecido invasões ao
Poder Legislativo. Fomos eleitos para fazer as legislações pertinentes a
diversos temas. Cada Poder deve se restringir ao seu papel. Essas frentes
[parlamentares] reunidas com o PL e o Novo vêm defender as prerrogativas da
Câmara dos Deputados e do Senado Federal”, afirmou Côrtes.
O discurso foi enfatizado por Pedro Lupion (PP-RR),
presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). “Sejamos deputados ou
senadores, cabe a nós a tomada de decisões em nome da sociedade brasileira.
Seja na relativização constante do direito de propriedade, seja na liberação
das drogas e do aborto, na dificuldade constante da garantia da legítima
defesa, na regulação de redes sociais e liberdades individuais… Isso tudo que
as frentes parlamentares congregam”, destacou Lupion.
Marco Temporal
Entre os temas levantados pelos parlamentares, o marco
temporal é o que se encontra em fase mais avançada de discussão no STF. Na
última semana, a Suprema Corte considerou inconstitucional a tese que limita a
demarcação de terras indígenas.
Definiram, ainda, que as terras de ocupação tradicional
indígena são de posse permanente da comunidade, cabendo a esse povo o usufruto
exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes. Na
qualidade de terras públicas, as áreas indígenas são inalienáveis,
indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.
Já no Senado, os parlamentares aprovaram, na quarta
(27/9), sob
pressão da bancada ruralista, projeto de lei (PL) que estabelece o marco
temporal. O texto teve 43 votos favoráveis e 21 contrários, aprovado
até mesmo por senadores de partidos que teriam entrado na base do governo, como
Republicanos e PP.
Aborto
Já a ação
sobre interrupção da gravidez que tramita no STF entrou em plenário virtual na
semana passada, mas houve pedido de destaque por parte do ministro
Luís Roberto Barroso. Assim, a votação vai a plenário presencial.
Ainda não há data para essa votação presencial acontecer.
Antes de Barroso, a primeira a votar foi a ministra Rosa Weber,
relatora do caso desde 2017. E ela votou pela descriminalização do aborto até a
12ª semana de gestação.
Em seu voto, Weber citou decisões mundo afora sobre o
assunto. Segundo a ministra, existe a proteção dos direitos futuros do
nascituro, mas que, para o direito civil, essa definição clara do que é vida
não existe.
No Congresso, tramitam quase 200 projetos sobre o tema. A
oposição, encabeçada pelo senador Rogério Marinho (PL-RN), apresentou proposta
para que seja realizado plebiscito sobre o aborto. A iniciativa é uma consulta
à população para saber se os brasileiros são contrários ou favoráveis ao tema.
Drogas
A
descriminalização do porte e da posse de drogas também é discutida na Suprema
Corte. O julgamento sobre o tema foi suspenso em 25 de agosto, com placar
de 5 a 1 pela descriminalização, depois de pedido de vista do ministro André
Mendonça. Ele tem o prazo de 90 dias para a devolutiva.
Se o plenário, que tem 11 ministros, decidir pela
descriminalização, não serão liberadas as drogas no Brasil nem a venda de
entorpecentes. O que está em discussão na Corte é se o ato de adquirir, guardar
e transportar entorpecentes para consumo próprio é crime.
A discussão no STF também acendeu fortes reações no
Congresso, desta vez capitaneadas pelo próprio presidente Rodrigo Pacheco
(PSD-MG). O
senador apresentou proposta de emenda à Constituição (PEC) para criminalizar a
posse e o porte de qualquer tipo de droga. “O entendimento do Senado é no
sentido de que a política antidrogas deve envolver a recriminação do tráfico ilícito
de entorpecentes com veemência. E que a descriminalização do porte para uso, de
maconha ou qualquer outra droga, sem uma política pública discutida no
Congresso, é uma decisão isolada que afeta o combate ao tráfico de drogas”,
explicou Pacheco.