cnn -16/06/2024 09:22
As Forças Armadas gastam cerca de R$ 25 milhões por ano com
pagamento de pensões aos parentes dos chamados “mortos ficto”, como são chamados
os militares que estão vivos, mas receberam penalidade máxima de expulsão da
corporação.
Por lei, nesta situação, familiares passam a ter direito de
receber o salário de quem “morreu apenas no papel”.
Ao todo 404 ex-militares estão nessa condição. A maior parte
do Exército (238), seguido pela Força Aérea Brasileira (99) e a Marinha (67). Juntas,
as três Forças pagam pensão a 560 pessoas, entre esposas, companheiras e
filhas.
As informações foram obtidas por meio da Lei de Acesso à
Informação (LAI) pela Fiquem Sabendo, uma organização sem fins lucrativos
especializada em transparência, e repassadas à CNN.
A figura jurídica do “morto ficto” foi criada para atender à
Lei 3.765, de 1960, que regulamenta as pensões militares. O texto definiu que o
militar expulso não perde o direito aos vencimentos já que, durante o tempo em
que serviu, parte do salário era recolhida para custear o benefício.
Como o pagamento não pode ser feito diretamente aos
condenados, eles passaram a ser considerados “mortos fictícios” (como também
são chamados), e os familiares ganharam o direito de receber o salário do
oficial ou praça.
Nove ex-coronéis estão entre os “mortos fictícios” do
Exército. Um deles foi preso em 2014 com 351 kg de maconha prensada em um fundo
falso de um furgão no Rio de Janeiro.
Ele foi condenado pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro
em 2015 e o processo transitou em julgado em 2020. O Superior Tribunal Militar
(STM) só confirmou a perda do posto e da patente em 2022. Há três anos, a filha
do ex-coronel recebe mensalmente R$ 13,4 mil.
Recentemente um caso veio à tona envolvendo a falsificação
dos cartões de vacina do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de seus
familiares. Um dos envolvidos na fraude, o ex-major Ailton Barros, apesar de
ostentar a patente, havia sido expulso do Exército anos atrás.
A Justiça Militar o condenou por uma série de investigações
internas – em uma delas, foi investigado por atropelar um integrante da Polícia
do Exército que tentou parar o seu carro em uma ocorrência de trânsito na Praia
Vermelha, no Rio de Janeiro.
Isso significa que, mesmo se for condenado agora por suposto
vínculo com a falsificação de documentos, nada mudará. Parentes continuarão a
receber a pensão de R$ 22,8 mil brutos, ou R$ 14,9 mil líquidos, como ocorre
desde outubro de 2008.
O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União
tenta reverter esse benefício. Citando argumentos de responsabilidade fiscal, o
procurador Lucas Furtado pede que o Tribunal reavalie seu entendimento sobre o
direito à pensão por morte ficta “em consonância com a evolução da sociedade,
do Direito e da própria Constituição Federal”.
“A chamada “morte ficta” mostra-se inteiramente incompatível
com o regime das pensões militares ao tornar a expectativa de vida do
contribuinte objeto de ficção e ferir de morte esse fator absolutamente
relevante para o equilíbrio atuarial”, escreve Furtado.
A CNN tentou contato com os advogados de Airton
Barros, mas até o momento não obteve retorno