folhapress -23/01/2025 08:30
Um estudo publicado nesta quarta-feira (22) na revista
médica Jama Network Open revelou que as mulheres enfrentam um risco
significativamente maior de desenvolver Covid longa em comparação aos homens,
com exceção da faixa etária de 18 a 39 anos, onde os riscos são semelhantes.
Pesquisas anteriores já indicavam que as mulheres têm maior propensão a
apresentar sintomas persistentes após a infecção pelo coronavírus, um fenômeno
possivelmente influenciado por fatores hormonais e imunológicos.
O estradiol tem papel central nesse processo, fortalecendo a
resposta imunológica inicial das mulheres. No entanto, altos níveis do hormônio
podem prolongar a inflamação, contribuindo para a persistência dos sintomas. Em
contraste, a testosterona, mais abundante nos homens, tem efeito
imunossupressor, reduzindo a probabilidade de Covid longa, mas aumentando a
vulnerabilidade a casos graves da doença.
"O estradiol fortalece a resposta imune inicial em
mulheres, regulando células-chave como macrófagos e células dendríticas e
melhorando nossa defesa contra o vírus", afirma o infectologista Alexandre
Naime, da Unesp (Universidade Estadual Paulista).
As diferenças imunológicas entre homens e mulheres também
desempenham um papel fundamental. Mulheres possuem uma resposta imunológica
inata mais robusta, o que combate melhor infecções iniciais, mas pode causar
inflamações prolongadas.
A ativação exacerbada das células T e das células "natural
killer", defensores cruciais do sistema imunológico que protegem o corpo
contra infecções e eliminam células cancerígenas, pode prolongar a inflamação e
dificultar a recuperação completa. Naime explica que "essa intensa
atividade imunológica e a dificuldade em eliminar completamente o vírus podem
resultar em uma ativação contínua, associada à persistência dos sintomas".
Adicionalmente, a tendência das mulheres a desenvolverem
autoanticorpos após infecções virais, que atacam tecidos do próprio corpo,
contribui para sintomas como fadiga e dores musculares. Essa condição está
vinculada a doenças crônicas mais prevalentes em mulheres, como fibromialgia e
outras condições autoimunes, que compartilham fatores predisponentes com a
Covid longa, influenciados pelo estrógeno e pelo cromossomo X.
Fatores relacionados à menopausa e gravidez também
influenciam o risco. Mulheres de 40 a 54 anos não menopáusicas têm maior
predisposição, enquanto a gravidez pode aumentar os riscos em certos casos.
Entretanto, mesmo quando mulheres grávidas foram excluídas do estudo, ser do
sexo feminino continuou sendo um fator de risco.
Segundo Max Igor Lopes, do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo), "as mulheres
possuem maior probabilidade de ativação imunológica, o que as torna mais
suscetíveis à Covid longa, embora os fatores exatos ainda não sejam totalmente
conhecidos".
Além dos impactos físicos, como perda de função pulmonar, a
Covid longa tem consequências graves na saúde mental das mulheres, incluindo
ansiedade e depressão, o que compromete a qualidade de vida. Esses efeitos
destacam a necessidade de estratégias específicas de prevenção e tratamento
para o público feminino.
Lopes explica também que os danos diretos causados pelo
vírus durante a infecção aguda também desempenham um papel importante no
desenvolvimento da Covid longa.
O estudo foi conduzido com base na RECOVER-Adult, a maior
coorte de história da Covid longa, abrangendo 83 locais nos Estados Unidos.
Foram analisados 12.276 participantes, sendo 73% mulheres, recrutados entre
outubro de 2021 e julho de 2024.
Os participantes foram acompanhados com questionários
trimestrais e exames anuais. A análise foi ajustada para fatores
sociodemográficos, vacinação, hospitalização e comorbidades, com estratificação
por idade e status menopausal.
Além disso, os autores destacam limitações, como viés de
seleção e falta de dados sobre níveis hormonais e uso de medicamentos. Eles
enfatizam a necessidade de mais pesquisas para compreender os mecanismos
biológicos subjacentes e desenvolver intervenções eficazes para mulheres, que
enfrentam riscos desproporcionalmente maiores de Covid longa.