cnn -14/06/2024 13:51
Pesquisadores do Insper investigaram os efeitos da
manipulação da data do parto no período do carnaval. Os resultados sugerem que,
usualmente, as brasileiras estão dando à luz muito cedo, prejudicando a saúde
dos recém-nascidos.
As evidências mostram que, no Brasil, muitas cesáreas
previstas para ocorrer em meio ao feriado de carnaval são antecipadas ou
postergadas. Pesquisadores do Insper Instituto de Ensino e Pesquisa
investigaram os efeitos dessa manipulação da data do parto na saúde dos bebês.
Os resultados foram divulgados este mês no periódico Health Economics.
A postergação de partos, mostra o artigo,
gera aumento na idade gestacional e uma redução na mortalidade neonatal. Já a
antecipação reduz a idade gestacional e o peso ao nascer dos bebês – sobretudo
daqueles de gestações de alto risco e da parte inferior da distribuição de peso
ao nascer. Em termos líquidos, as festividades de carnaval,
na média, aumentam o tempo gestacional em 0,06 dia e reduzem as taxas de
mortalidade neonatal e de mortalidade neonatal precoce em 0,30 e 0,26 por 1 mil
nascidos vivos, respectivamente.
O estudo foi realizado por Carolina Melo e Naercio Menezes
Filho, ambos economistas e professores do Insper.
“Nossa pesquisa mostrou que existe, sim, uma extensa
manipulação das datas dos partos em função do feriado de carnaval. Isso
acontece por meio do deslocamento de cesarianas programadas e envolve,
principalmente, mulheres menos vulneráveis, de maior nível educacional”, diz
Melo.
A pesquisadora aponta que a tendência entre mães de nível
educacional mais alto é a antecipação dos partos, para que estes não venham a
ocorrer durante o feriado. Mas esse tipo de providência, que privilegia o
conforto da parturiente e do médico, encurta artificialmente o período de
gestação, podendo colocar os bebês
em risco.
“Quando, por vários motivos, os nascimentos não podem ser
antecipados por meio de cesarianas, as gestantes acabam esperando um pouco mais
e muitas entram em trabalho de parto naturalmente e acabam tendo partos
vaginais. As análises mostram que isso pode levar a resultados melhores em
termos de maturidade gestacional e sobrevivência neonatal”, afirma Melo.
A professora acrescenta que um aumento líquido de 3,5 dias
no tempo gestacional dos partos cujas datas foram manipuladas pode levar a um
ganho de peso de 60 gramas. Na verdade, como partos antecipados e postergados
entram nessa conta, Melo diz que é provável que os efeitos positivos em tempo
gestacional e peso ao nascer para os partos postergados sejam até maiores.
A pesquisadora alerta que, se a postergação de partos devido
a um feriado é capaz de mexer em um indicador tão extremo como mortalidade
neonatal, é provável que o comum seja os nascimentos ocorrerem muito cedo no
país – fato associado à antecipação de partos por meio de cesáreas eletivas
–, e os bebês nascerem com condições de saúde piores do que eles poderiam
nascer caso as gestações fossem prolongadas.
Como destaca a pesquisadora, nos hospitais totalmente
privados do Brasil (que não atendem SUS), 86% dos partos são cesarianas. O
índice é muito mais elevado do que a média nacional, de 55%, que já é
altíssima. Vale lembrar que a proporção de partos cesarianos recomendada pela
Organização Mundial da Saúde (OMS) é de até 15%. E que, com seus 55%, o Brasil
ocupa a segunda posição no ranking mundial, depois da República Dominicana
(58,1%).
Embora a pesquisa em pauta tenha fechado seu foco no período
do carnaval, a pesquisadora acredita que a tendência de antecipar
artificialmente as datas dos partos é mais geral, e não se restringe aos feriados.
“Enquanto a OMS recomenda um período gestacional mínimo de 39 semanas, a média
brasileira é de 38,5 semanas. Isso significa que muitos bebês estão nascendo
antes do tempo seguro”, diz.
O estudo enfatiza a necessidade de políticas públicas que
restrinjam a antecipação de partos sem justificativas médicas, para minimizar
os riscos associados a nascimentos prematuros e baixo peso ao nascer.
A pesquisa recebeu apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado de São Paulo (Fapesp) por meio de Bolsa de Pós-Doutorado concedida a
Carolina Melo e do Centro Brasileiro para o Desenvolvimento na Primeira Infância (CPAPI),
um Centro de Pesquisa Aplicada (CPA) coordenado por Menezes Filho e
constituído em parceria com a Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal.